A tecnologia social dos Casos para a Transformação como estratégia de crescimento

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Entendemos que a tecnologia transcende o conceito de digital. Vemos o computador como um dos mais poderosos instrumentos de aprendizagem da humanidade e acreditamos no seu potencial de transformação para criar uma sociedade mais colaborativa, diversa, justa e equitativa. E apostamos também na criação de novas tecnologias para efetivar mudanças. 

A fim de evidenciar as transformações mobilizadas em educadores, estudantes e comunidades e inspirar cada vez mais pessoas a se engajarem em processos de mudanças das culturas de aprendizagem, temos desenvolvido a tecnologia social dos Casos para a Transformação. Trata-se de uma conexão do investimento em comunicação ao propósito de intervenção social. 

Utilizamos Casos para a Transformação no projeto Escolas Conectadas, uma iniciativa ProFuturo, da Fundação Telefônica Vivo em parceria com a Fundação “la Caixa”, e na Parceria pela Valorização da Educação (PVE), do Instituto Votorantim.

Os dois projetos trabalham com conceitos de inovação dentro da área da Educação, dentro ou fora da sala de aula. Para isso, entre vários teóricos, recorremos aos estudos de David Tyack e Larry Cuban, em Tinkering towards utopia (1995). A dupla analisou 100 anos de tentativas de reformas (e inovação) no sistema de ensino médio norte-americano e designou o termo “gramática da reforma escolar” para se referir aos modelos de implementação de reformas dos projetos educacionais. 

A pesquisa apontou dois modelos predominantes: uma forma massiva e centralizada, com design predeterminado e estabelecido de cima para baixo, imposto às escolas com passos fixos para implementação; ou a inovação “pilotada”, por meio de experimentações em uma escola em um contexto controlado para posterior disseminação pela rede de escolas. Os autores evidenciaram que as escolas, quando não rejeitaram por completo as tentativas de reforma, adotaram uma versão reduzida daquele conceito inicial, adaptando-o às práticas correntes, sem alterar a essência do fazer pedagógico vigente. Apenas pequenas tentativas de reformas, usualmente estruturais (como alterações no espaço físico e na infraestrutura), conseguiram atingir seus objetivos. A conclusão de Tyack e Cuban é a de que a escola reforma a reforma antes que a reforma reforme a escola.

Esse fenômeno foi também observado por Seymour Papert, que o chamou de “ideias desempoderadoras” (disempowering ideas). Ao analisar a trajetória da adoção da linguagem Logo pelas escolas, Papert observou como o sistema escolar assimilou (no sentido Piagetiano do termo) as “ideias poderosas” por detrás do ensino de programação para crianças (pensamento computacional), convertendo-as em uma forma enfraquecida de programação como um conteúdo escolar. Para Papert, é necessário abordar a mudança na escola como um problema de aprendizagem, ou seja, um processo sistêmico.

Dentro dessa perspectiva, seguimos a teoria de David Cavallo, que aborda o problema da disseminação de inovações na educação por meio do desenvolvimento de modelos de crescimento diferentes daqueles observados na gramática da reforma de Tyack e Cuban, propondo um design emergente “de baixo para cima”.

Aplicamos o que Cavallo (2004) interpretou a partir dos estudos de Thomas Kuhn sobre a evolução das ideias científicas, que identificam que o surgimento de novos paradigmas é baseado em três elementos: referências, modelos e linguagem (exemplars, models and symbolic expressions). Traçando paralelos entre as ideias de Kuhn e iniciativas reais de implementação de projetos de tecnologias na educação, Cavallo localizou condições sistêmicas para novos paradigmas de educação emergirem. A partir delas, propôs uma reflexão acerca de modelos de crescimento alternativos para iniciativas de inovação pedagógica, que denominou design emergente.

Os Casos para a Transformação são uma tecnologia para implementação de projetos de inovação em educação em escala, que buscam contribuir na disseminação de novas ideias pedagógicas como parte de novos modelos de crescimento sistêmicos. Eles comunicam os elementos mais relevantes da inovação de forma que professores e praticantes tenham referências e possam testar, adaptar e debugar as ideias sem “desempoderá-las”. 

Casos para a transformação usam técnicas jornalísticas de entrevista e apuração de uma história para aplicar os fatores mapeados por Kuhn e Cavallo, produzindo peças de comunicação que são parte essencial da estratégia do projeto, ou seja, são também instrumentos de formação e intervenção.

Casos para a Transformação no Escolas Conectadas

Atuamos como parceiros do Escolas Conectadas desde 2015, criando e gerenciando formações continuadas a distância. Mais de 65 mil cursistas já completaram formações na plataforma. O projeto também recebeu o prêmio Hamdan Bin Rashid Al-Maktoum de Prática e Desempenho Extraordinário na Melhoria da Eficácia dos Professores, da Unesco, em 2020.

Os cases elaborados no projeto são histórias das experiências dos professores que aplicaram os conhecimentos construídos nos cursos. São histórias de inovação nas práticas pedagógicas e de resultados que as mudanças geraram nos processos de aprendizagem dos estudantes. Clique aqui para ler os cases no nosso blog. 

O conteúdo que produzimos documenta o impacto nos beneficiários diretos do projeto, que são os professores. Além de publicizar os cursos e promover ações que podem ser disseminadas, os conteúdos são uma pequena amostra de como a atuação do projeto pode modificar um contexto educacional. 

Veja um trecho da história da professora Débora, de Roraima:

A professora criou, no início do ano letivo, um grupo da turma no WhatsApp. O que começou como um desejo da professora virou o principal canal de comunicação entre ela e os alunos durante a pandemia de Covid-19. Débora usa o aplicativo de mensagens para enviar atividades e manter o vínculo com a turma. Os alunos que não dispõem de conectividade recebem as atividades impressas em casa, com todos os cuidados necessários, por meio de um mensageiro.

— Comecei vendo as ideias dos cursos da plataforma sobre vídeos, eu tinha curiosidade. Peguei algumas técnicas aqui do curso Escola Digital: curadoria de Objetos Digitais de Aprendizagem e passei para eles “no grupo do zap da turma” e nas orientações impressas. Tem surtido muito efeito nas aulas de artes, de apresentar o que compreendeu do conteúdo, nas aulas de projeto — conta a professora.

Podemos notar a presença dos três elementos sintetizados por Kuhn e Cavallo: referências, modelos e linguagem. Por construir um relato destinado aos pares, o caso para a transformação estabelece referências nas quais outros professores podem se inspirar. A atividade pedagógica destacada no caso reporta novos comportamentos dentro de um novo paradigma, ou seja, práticas inovadoras que os demais professores podem adotar, adaptar e aplicar com seus próprios alunos. Já a linguagem introduz expressões características da inovação pedagógica, que auxiliam o leitor a diferenciar a prática abordada de outras, características do modelo vigente. Novas palavras demandam a construção de novos conceitos para diferenciá-los dos antigos.

Também trazemos um breve contexto da realidade da professora, que ilustra sua trajetória e pode sensibilizar outros educadores. Ao lecionar em uma escola pública da zona rural do interior do norte do país, a docente tomou decisões no seu fazer pedagógico que foram impulsionadas pelos mesmos ideais de inovação educativa que regem o projeto. Relatamos as decisões que a motivaram a inovar e as ações desencadeadas pelo movimento de mudança entre seus alunos: uma referência de atuação.

Especialmente em 2020, vários dos cases que publicamos são histórias de professores que, com a incumbência da aprendizagem remota em razão da pandemia, viram nas formações uma oportunidade de embasamento teórico e prático para o novo cotidiano que se apresentou. São exemplos:

  • A professora Débora Pizapio Moreno, de Roraima, que buscou referências no curso Escola Digital: curadoria de Objetos Digitais de Aprendizagem para promover atividades em vídeo com os alunos via WhatsApp;
  • A professora Lucenilde Rodrigues Santos, de Sergipe, que com o curso Produção colaborativa de conhecimento teve a ideia de fazer um quiz com os alunos (o qual virou até uma produção no aplicativo TikTok);
  • A professora Aldair Miranda Mozer, do Espírito Santo, que assumiu a posição de professora dos colegas, auxiliando outros educadores no contato com a tecnologia ao aplicar o que aprendeu na formação Tecnologias de informação e comunicação a serviço da educação: conhecimentos avançados.

As histórias contadas no blog não são, necessariamente, sempre de sucesso. Nos esforçamos para mostrar que houve dificuldade e desafios superados. Os desafios que os professores de escolas públicas enfrentam são, muitas vezes, similares, independente da região do país em que se encontram. Por isso, ilustrar como alguns deles estão gerenciando dificuldades e encontrando soluções – com o auxílio dos cursos – pode ser um caminho inspiracional ao público que recebe esse conteúdo.

Histórias reais também têm maior poder de se relacionar com o público. A partir do momento em que os cursistas da plataforma virtual de aprendizagem se tornam “pessoas reais”, que, assim como os demais educadores, se desdobram entre escolas, preocupam-se com os estudantes, são ‘profes’ ou ‘soras’, eles ganham a identificação e afeição do nosso público. 

Para a divulgação desse material, usamos os canais de e-mail marketing com os cursistas que estão cadastrados na plataforma, e o blog ocupa um espaço de destaque na página inicial do site do Escolas Conectadas. Apostamos nessa tecnologia social como uma das nossas estratégias para crescimento do projeto desde 2016.

Casos para a Transformação na Parceria pela Valorização da Educação

O PVE é um programa que trabalha com três frentes para a transformação da educação pública no Brasil: gestão educacional, gestão escolar e mobilização social. A HardFun atua como parceira nesse projeto desde o início de 2019, quando começou a trabalhar com a mobilização social das comunidades pela valorização da educação.

A frente de mobilização social do projeto se propõe a envolver pessoas que não tenham relacionamento direto com a Educação para que se engajem e conheçam a realidade educacional do seu município. Em 2020, foram 75 municípios atendidos em todo o Brasil. 

Os casos para a transformação, nesse contexto, visam a representar o público do programa que se envolve e gera mudança no seu cotidiano, dentro das cidades atendidas pelo projeto. São histórias como a do Pedro Henrique, do sul da Bahia, que organizou o grupo de jovens da cidade e liderou a criação do Grêmio Estudantil na escola dele, ou a mobilização em Camaçari, que trabalhou o orgulho de ser negro com os jovens do município por meio da arte e da dança.


Os cases do PVE são divulgados por meio das redes sociais do projeto, para que sejam recebidos pelo público que desejamos que se una à causa, provocando mudança em escala a partir de sistemas educacionais municipais.

Artigo escrito por:

Juliano Bittencourt

Juliano Bittencourt

Diretor Executivo

Patrícia Schäfer

Patrícia Schäfer

Membra honorária da HardFun

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